[CINEMA] A NOIVA/NEVESTA (2017)

O cinema ocidental (leia-se estadunidense) de terror sobrenatural está morto. Morreu sem muito alvoroço lá pelos anos 90 e ninguém se deu conta. Em seus últimos momentos, suspirou com remakes (Carnival of Souls) e apelações para efeitos especais inovadores na época (13 Ghosts). Aquele responsável por pérolas como Os Inocentes e A Troca já respirava por aparelhos.


Foi então que o ocidente (não apenas os EUA) foi tomado pelo terror oriental, em especial o de países asiáticos como Japão, Coréia do Sul e China. Rapidamente, Hollywood se encarregou de começar a produzir remakes a rodo deles também. O Chamado, O Grito, Um Conto de Duas Irmãs e até Água Negra, dirigido pelo brasileiro Walter Salles, todos foram refilmagens produzidas pelo tio Sam, quem parece sofrer de um sério complexo de inferioridade quando vê outros países produzindo algo melhor que o seu.

Hoje, basicamente, todo cinema de terror sobrenatural deste lado do Pacífico é feito sob influência direta daquele do oriente. As grandes franquias como Sobrenatural, Invocação do Mal etc, mesmo produzidas nos EUA, são capitaneadas por James Wan, por exemplo. Até filmes como A Mulher de Preto (leia a resenha aqui) são diretamente inspirados na construção da linguagem vista no cinema daquela parte do planeta.

Assim, chegamos Á Noiva (Nevesta, em sua língua original), vindo diretamente do oriente, mas agora da Rússia, embora ainda mantendo artística e narrativamente todos os elementos vistos nas produções asiáticas, dando um leve aceno para produções hollywoodianas.

A trama tem dois momentos: o primeiro no passado, quando o bisavô do noivo de Nastya (Victoria Agalakova), Vanya (Vyacheslav Chepurchenko), faz um ritual sinistro para trazer de volta à vida sua própria esposa morta após o casamento. Anos depois, o casal vai para a casa da família no interior onde precisa lidar com as repercursões daqueles atos hediondos de mais de 100 anos atrás.

No geral, os atores são bons, mas não espetaculares. Sinceramente, neste tipo de produção, isto nem é obrigatório. A história tem contornos evidentemente macabros e alguns momentos assustadores (não confundir com sustos, isto o filme tem em doses pequenas). Foi realmente intenção do diretor Svyatoslav Podgayevskiy apelar para um terror entre o psicológico e o sobrenatural na construção da narrativa e do universo em volta da casa e da família. O resultado é um cenário tétrico sendo este o maior trunfo e qualidade da produção.

Entre o começo e o fim, porém, a narrativa apela para elementos por demais bruscos, beirando e alcançando muitas vezes o banal, para construir situações e porquês. Desde o motivo do casal ir para a casa da família do rapaz no interior até decisões estúpidas tomadas pela protagonista no clímax, são escolhas erradas e forçadas demais do roteiro que acabam comprometendo o engajamento intelectual com a história. Em seus momentos finais, A Noiva soa mais hollywoodiano do que o esperado (ou desejado).

Impossível não lembrar de produções como Mama, Os Outros ou até O Massacre da Serra Eletrética, filmes dos quais a equipe de A Noiva pega elementos hora de forma emprestada, hora assaltada de arma na mão, desde o mórbido costume de se bater fatos de defuntos do começo do século passado da era comum até jovens presos numa casa interiorana lidando com uma família de loucos.

O interior russo ainda é uma região onde o tempo parou até hoje, repleto de velhas tradições pré-Revolução Socialista ou de seu começo e também o local preferido para emboscadas de solteiros buscando as "noivas russas" (ou noivos) pela internet. Nâo é de espantar que haja um completo senso de isolamento, impotência e insegurança permeiem todo filme.




Dentre os dois momentos, passado e presente, o primeiro se sai muito melhor e teria sido interessante se o filme talvez focasse mais na trama de 100 anos atrás, ignorando a parte atual.

Porém, o maior problema de Nevesta é sua crise de identidade. Os roteiristas simplesmente não sabiam o que queriam fazer: um filme de fantasma? De "monstro"? De possessão? De assombração? Ele navega por todos e se sai bem apenas em poucos acertos significativos. Funcionaria ingegavelmente melhor como um filme assumidamente de terror sobrenatural o que ele, em última análise, não é, aproximando-se mais nos erros do que acertos do já citado Mama, com quem divide várias decisões criativas equivocadas.

Infelizmente, não posso recomendar nem para os fãs do gênero senão com sérias ressalvas. Apesar da boa direção e fotografia, existem muitos lugares comuns que sobrecarreram a narrativa com o "mais do mesmo". Não é um filme necessariamente ruim, mas não é um investimento de tempo para todos. Porém, se você ainda quiser ver, vale pela curiosidade de conhecer um pouco do novo cinema russo, corajoso o suficiente para enveredar por gêneros como super-heróis e histórias de (quase) fantasmas.

Em nota pessoal, senti-me engano pois uma das cenas mais aterradoras do trailer, a do começo, não está no filme. Aliás, muitas outras estão ausentes no corte final, ao menos este exibido no Brasil, um problema cada vez mais comum em filmes lá no oriente e cá no ocidente.

Outro ponto extremamente desagradável é o fato de, ao menos na cidade onde moro, Belo Horizonte, todas as cópias terem vindo dubladas. Parece que as distribuidoras ainda não confiam na capacidade de público gostar de qualquer coisa falada em outra língua que não a inglesa.



1 comentários:

 
Formado em Design Gráfico pela UEMG, apaixonado por História, Sociologia, Literatura, Filosofia, sociedades orientais, culturas antigas e cinema asiático.

Meus hobbies são leitura, escrever, games, desenhar e colecionismo (livros, filmes, quadrinhos, figuras de ação, dvds etc). Também possuo um blog dedicado ao Superman, o Kryptonauta.

Mais sobre mim aqui.